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segunda-feira, 22 de junho de 2020

Israel da Silva Oliveira. QUILOMBO CAJÁ DOS NEGROS EM MEIO A PANDEMIA DE COVID19



UM OLHAR SOBRE O QUILOMBO CAJÁ DOS NEGROS EM MEIO A PANDEMIA DE COVID19

Israel da Silva Oliveira


             Quilombola da comunidade Cajá dos Negros e estudante de Ciências Sociais, UFAL
             Esta publicação deve-se ao Professor Amaro Hélio Leite da Silva


Esse texto, de caráter descritivo, sobre os efeitos da pandemia na comunidade Quilombola Cajá dos Negros, localizada no município de Batalha/AL, embora não represente a realidade dos quilombos em Alagoas, espero que possa ser útil para a reflexão de parte dessa realidade, como também uma voz nessa narrativa.

Os efeitos da pandemia na realidade brasileira atingem a dinâmica do país de forma negativa, agravando as condições sociais de parte da população, sobretudo de grupos quilombolas, que não estão nas melhores condições desta composição social, e sim à margem do “plano desenvolvimentista” do país.

Certificada em 2005 pela Fundação Cultural Palmares, a comunidade Quilombola Cajá dos Negros possui cerca de 86 famílias e se encontra em processo de obtenção para titulação das terras. Até o presente momento, no que se refere a uma política de acompanhamento do governo federal na comunidade, não existe qualquer ação. Na terça feira, dia 16/06/2020, foi aprovado na câmara dos deputados o projeto de lei 1142/20 que apresenta uma proposta de combate ao coronavírus para os indígenas e quilombolas em âmbito nacional. Com relação a Alagoas, o Tribunal de Justiça solicitou que a Secretaria de Saúde garanta a inserção de informações sobre as comunidades quilombolas e povos indígenas na coleta de dados em prontuários médicos e registros relacionados ao Covid-19.

Desta maneira, até que se efetue essa solicitação e o projeto de lei, como também o acompanhamento e as orientações sanitárias necessárias, as comunidades quilombolas – inclusive a Cajá dos Negros – estarão numa condição de invisibilidade no cenário epidemiológico alagoano.

Depois de um levantamento estatístico na comunidade, segundo a líder comunitária Ivaniza Leite da Silva, até o momento da escrita deste texto (19/06 /2020), apareceram dois casos da Covid-19 de quilombolas residentes na comunidade. É importante destacar que só um desses casos entrou para a contagem, pois foi detectado em exames já no hospital em Arapiraca, devido a outras complicações que levou o indivíduo a tratamento.  Desta maneira, sem a existência de teste para o acompanhamento epidemiológico da comunidade, nos encontramos na situação de incerteza e desinformação quanto a real situação de infectados comunitariamente e a real gravidade do novo coronavírus para as nossas vidas. Ainda segundo Ivaniza, a comunidade tem, atualmente, cerca de trinta pessoas com problemas de diabetes e hipertensão, além de um número de indivíduos considerável que é de extrema importância para o grupo, os idosos; ou seja, uma parcela significativa do grupo de risco.

Até o momento, chegou à comunidade a doação de quarenta cestas básicas de alimentos pela Associação de Agricultores Alternativos (AAGRA), distribuídas entre as famílias mais necessitadas. Em meio a essa realidade, por iniciativas próprias e articulação de informação entre lideranças quilombolas do estado, vem se realizando buscas e inscrições em editais e fundos de recursos para o enfrentamento da pandemia. Com parceria na elaboração de projeto junto a alunos da UFAL, através do Núcleo de Estudos do Semiárido Alagoano, a comunidade foi aprovada no fundo Baobá, com um projeto que visa realizar na comunidade a seguintes ações: transformar a sede comunitária em um centro de apoio, com objetivo de produzir material informativo sobre o covid19; e transformar a mesma sede em local de recebimento e distribuição de alimentos, produtos de higiene e produção de máscaras. Dentro deste mesmo edital, destina-se a compra de material de higiene e alimentos a serem distribuídos comunitariamente.

Outra ação importante da comunidade foi a emissão de um requerimento ao Tribunal de Justiça de Alagoas solicitando auxílio para o combate ao Covid19, que não foi aprovado pois justificaram que essa solicitação foi feita através da associação que, no presente momento, não estava juridicamente preparada para atender os requisitos. Isto pode nos levar a uma reflexão sobre as comunidades quilombolas não certificadas, que dentro desta realidade torna-se invisibilizadas, conforme afirmamos anteriormente, ou seja, uma invisibilidade institucional.

É de extrema importância o reconhecimento da realidade quilombola e ações governamentais para com as comunidades, inclusive a Cajá dos Negros, em meio as demais. Caso o acesso à terra, em processo de titulação, estivesse efetuado, considerando a situação acima descrita, julgo que a pandemia teria efeitos diferentes; não eliminando sua existência na realidade quilombola em Cajá dos Negros, mas oferecendo mais capacidade de isolamento social, saúde e proteção à vida; além de efeitos econômicos menos graves, assegurando condições de reprodução social.



Vidas quilombolas importam! Vidas do Cajá importam!

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