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sábado, 25 de julho de 2020

Joca de Almeida Mariano: Potocas da epidemia




Potocas da epidemia
Joca de Almeida Mariano

 Clique e escute a maravilha da história

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Igor Luiz Rodrigues da Silva. Nossos olhares sobre aqueles e aquelas



Nossos olhares sobre aqueles e          aquelas

Igor Luiz Rodrigues da Silva
Yaó de Oxumaré do GUESB

Quando fui convidado a escrever esse pequeno texto, narrando como eu, sendo um Umbandista, estaria vivenciando a pandemia do Covid-19, fiquei dias pensando o que colocar no papel e que pudesse, para além de descrever essa experiência minha, individual e ao mesmo tempo coletiva, ser também um instrumento de levar para quem ler, uma palavra de otimismo e acolhimento.
 Desde que fui escolhido por Oxumaré, há cinco anos atrás, para cuidar de sua tranqueira no GUESB (Grupo União Espirita Santa Barbara), sob a liderança da nossa Ialorixá Mãe Neide Oyá D’ Oxum, que a minha trajetória tem sido atravessada por recorrentes desafios, planos, vitorias, bem como, de constantes questionamentos sobre a minha própria caminhada enquanto um ser umbandista. Ao longo desse caminho, renuncias, perdas, ganhos, lagrimas, tristezas, alegrias, aceitação, negação, rejeição, tem provocado inúmeros questionamentos, muitos dos quais sem respostas prontas e imediatas.
Diante dessa pandemia que estamos atravessando, os Orixás e as Entidades, tem sido então, o ponto de conexão que tem me orientado a fortalecer minhas próprias dores, meus próprios medos e angustias.  São fundamentais na construção das minhas narrativas cotidianas, pois viver em isolamento, requer antes de tudo, fortalecer as nossas demandas emocionais, fortalecimento dos nossos vínculos afetivos com nossas famílias, nossos amigos, com pessoas que nos são próximas e que agora tem se ocupar em proteger as próprias vidas. Neste sentido, eu posso separar esse meu atravessamento na pandemia em duas etapas ou experiências. A primeira delas se vincula ao espaço sagrado do GUESB.
No início da pandemia, entre os meses de março até meados de maio, o terreiro foi meu abrigo, minha morada, meu recanto de acolhimento e também de ensinamento. Esses quase três meses que fiquei por lá, foram importantes para o meu fortalecimento espiritual, na compreensão do meu dever e do meu chamado enquanto umbandista, filho de Oxumaré. Durante a estadia por lá também, junto com a nossa Mãe Neide, Pai João Paulo, Pai Ogã Júnior, e alguns irmãos e irmãs, que assim como eu, também estão ainda passando o isolamento social por lá, decidimos acolher o máximo que pudéssemos, as famílias em situação de vulnerabilidade agravada com a pandemia, com distribuição de sopa (duas vezes na semana) e também através de cestas básicas.
 Entre uma atividade social e outra, pudemos ainda fazer algumas lives via redes sociais do GUESB, com o intuito de propagar e disseminar mensagens de fé, de esperança em dias melhores. Ao mesmo tempo que produzíamos pequenos vídeos que postados, espalhavam orações e preces, pedindo aos Orixás discernimento diante das incertezas do caminho, fortalecendo sobretudo a nossa própria fé, a nossa própria missão e crescimento dentro do espaço sagrado. O silêncio, as memorias, as histórias dos antigos contadas através da nossa matriarca, se mesclavam com as nossas próprias relações estabelecidas durante esses intensos dias de convívio no terreiro.
 O segundo momento, se estabelece a partir do dia 18 de maio, quando eu deixo o terreiro e atravesso o país para desembarcar em Santa Catarina, e é aqui onde estou agora. É aqui desde 2017 eu faço o doutorando em Antropologia, e é aqui que são ampliados os sentimentos, os ensinamentos, que foram construídos nos meses anteriores dentro de terreiro. É aqui que o isolamento se amplia e toma forma mais acentuada, pois o convívio coletivo cede lugar para a solidão, para acentuação do silêncio dos dias, agravados ainda mais pela chegada do inverno, dias frios, chuvosos, até com presença de ciclones, me fazem ainda mais ter que acreditar que algo maior e mais forte está me guiando e me protegendo.
Como um filho de Oxumaré, guiado também por Iansã, Obaluâe, Nanã e Tempo, acredito (e agradeço todos os dias por isso) que estamos sendo convidados e convidadas a experienciar um novo mundo, novas possibilidades de caminhar sobre a terra, e que por mais duro que tenha sido, viver longe de que amamos, por mais pesado que o fardo parece ser, por mais doloroso que seja, ver alguém partir sem receber as devidas homenagens, nós que aqui ficamos, devemos traçar novos objetivos, novas metas, lançar nossos olhares sobre aqueles e aquelas que realmente precisam da nossa atenção, do nosso afeto e do nosso cuidado.
Por fim, para além dessa conexão mais forte, mais apurada com os Orixás e meus guias espirituais, tenho escrito a minha tese, vivenciado meus dias com muita música, com muita dança, escrevendo sobre minhas dores, minhas angustias, aprendendo também a fazer autorretratos, a ser mais forte e mais vivo em dias nublados, para que enfim, sejamos todos acolhidos dentro de um forte e caloroso abraço. Me visto de branco, quase todos os dias, com meus fios de conta no pescoço, acendo velas e me ponho de joelhos saudando e louvando, me conectando a minha ancestralidade, que habita em todo lugar.
Arroboboi!! 

Pandemia e Cultos de Matriz Africana se configura como um espaço democrático para a expressão das diferentes perspectiva sob as quais os povos de terreiros e seus sujeitos vivenciam e compreendem este momento singular de isolamento social e enfrentamento da COVID-19.

Nesse sentido, apresentaremos artigos escritos pelos próprio atores e atrizes sociais que protagonizam o cotidiano dos terreiros alagoanos em suas práticas litúrgicas, saberes e fazeres cotidianos. São Yalorixás, Babalorixás, Ogãns, e Ekedes, além de Yaôs que trazem a público sua visão de mundo construída com base em sistemas culturais particulares, onde a circularidade, a reciprocidade e a celebração da vida como sagrada predominam.

Esses Xangozeiros e Xangozeiras, dispersos por todos os rincões de nossa anfíbia terra, trazem com suas vozes, cânticos e contos, valores e princípios que podem ressignificar a tragédia pandêmica e nos revitalizar a esperança de dias melhores. Na ótica do Axé, nada se esgota em si, tampouco se explica por si, pois natureza, ser humano e sagrado se interconectam como um só. Ao desfrutar desses textos, portanto é possível que nossos leitores e leitoras reavivam sentidos já esquecidos para a suas existências e, talvez, aprendam com os terreiros que a  verdadeira magia é o mistério renascer em vida.  


                                             Arapiraca, Julho de 2020, ano da Pandemia



                                        Odé Akueran Ibadan / Prof. Dr. Clébio Correia

O blog pode concordar ou discordar no todo ou em parte, da matéria que publica





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