Reprodução de texto de 00/10/2014 |
Dois dedos de
prosa sobre Jorge Barboza
Jorge é amigo pessoal e ex-aluno. É portanto um
prazer ter a oportunidade de editá-lo. A isto junta-se o seu grande talento e
inquietação artística/intelectual, companheiro de muitas atividades aqui em
Alagoas, desde os tempos do Teatro Universitário, etapa da vida cultural de
Maceió que vem sendo pensada pela Gal Monteiro e que, brevemente, publicará
seus resultados preliminares nas páginas de Campus.
Jorge recorda e comenta o movimento do rock em
Maceió, cidade que ainda passava por um processo civilizatório, desbancando as
suas marcas sagradas e rurais, para entender-se urbana e prosaicamente mundana.
No sentido das relações espaciais da
cidade, o rock era uma de suas pontes para o mundo, caminho pequeno e
marginalizado mas se afirmando e dando
notícias de si mesmo.
Campus/O Dia diz muito obrigado e convida para uma
viagem dentro deste depoimento muito do bem escrito.
Luiz Sávio de Almeida
Maceió, maio de 2014
Jorge Barboza é formado em Jornalismo pela
Universidade Federal de Alagoas. Trabalhou nos jornais Tribuna de Alagoas,
Gazeta de Alagoas, Jornal de Alagoas e, morando em São Paulo entre 1988 e 2005,
nos diários Folha da Tarde, Notícias Populares e Agora São Paulo. Também
colaborou com revistas e jornais especializados em música e comportamento, como
DJ World, Mundo Mix Magazine e International Magazine – este no Rio de Janeiro.
Editou em Maceió a revista de cultura Urupema. Entre as capitais de Alagoas e
São Paulo, usando o pseudônimo Sebage, integrou as bandas de rock Sangue de
Cristo, Jesuítas, Trindade e The Ziggy Sounds (esta de covers de David Bowie).
Atualmente fora da cena musical, planeja reatar laços roqueiros na pauliceia em
2015. Enquanto isso, edita o site Alagoas Boreal, de cultura, turismo, meio
ambiente e história & patrimônio deste antigo território caeté.
E deus criou o rock alagoano
Um panorama da epopeia de guitarras, berros e atitudes que desafiam o tempo e o espaço
Jorge Barboza
O rock alagoano. Antes
disso, vamos considerar que já houve banda de iê-iê-iê e o repertório de baile
do antológico LSD no final dos anos 1960, liderado por Djavan e pelo legendário
guitarrista Fleury. Houve o Odisseia nos anos 1970, banda do baixista Fernando
Nunes (ex-Cássia Eller, atualmente tocando com Zeca Baleiro, mas deixando a
veia de roqueiro fluir, ainda, em formações como o trio carioca Flenks), e havia
o Porções Mágicas, com um jaggeriano Reinaldo Vieira fazendo covers, claro, dos
Rolling Stones, The Who e cia.
Um nome de muita responsa do
rock alagoano é Zé Barros, irmão mais novo de Fleury, com quem ele diz que
aprendeu tudo. Barros é o guitarrista herói dessa cena roqueira e aqui e ali ele
faz a irmã cantora, Leureny Barbosa, perpetrar interpretações clássicas de rock
como “Anjos do Sul” – dos Mutantes pós Rita Lee e Arnaldo Baptista –, isso já
nos anos 1980, em antológica performance no teatro Deodoro, e bem recentemente
na rede social de música YouTube, com uma incrível gravação de “Because”, dos
Beatles.
Boom de rock
Antes do Necronomicon, power
trio formado há cinco anos prestes a lançar o segundo disco, a banda Mopho dividia
as águas do tal rock alagoano em 1996, quando as facilidades tecnológicas deram
mais possibilidades às bandas locais de gravar as composições, compartilhar na
internet e pegar estrada rumo a destinos mais plausíveis. A Mopho virou um
culto dentro deste nosso pequeno universo de sonoridades mais ou menos hard,
mais ou menos psicodélicas, mais ou menos dark.
Dentro do meu corpo
Um buraco sem fim
Um absurdo
Um surdo
Um suspiro
Dentro do meu corpo
Um desejo mais reprimido
Um comprimido
Uma droga
Um prazer
(“Dentro do meu Corpo”, Pensão
Familiar)
Falando em dark, no final
dos anos 1980, vestíamo-nos todos de preto – o alter ego do repórter aqui
incluído, o Sebage, à frente da banda Sangue de Cristo, cantando dele e do
guitarrista Sílvio Marne coisas como “A Galinha sangra” e “O Montepio dos
Artistas”. O pós-punk alagoano... Impossível não evocar a também cultuada
Pensão Familiar, a banda da performática cantora e atriz Aline Marta Maia e da
cantora e compositora (não menos performática) Rosália Brandão.
E mais: a pioneira banda
punk Diarreia Cerebral, com o distinto concentrado guitarrista e compositor
Augusto Góes nas cabeças.
Muita gente deixou história
na seara: alegrias, frustrações e – claro, se vamos falar aqui de rock, punk
rock, hard rock e heavy metal – muita doideira. Como cantavam os Stones em 1974
sob uma onda de espuma de sabão (e nós continuamos a repetir), “é apenas
rock’n’roll, mas eu gosto”.
A galinha sangra
Na noite
Na escuridão
Embriagada
Sangue na estrada
Galinhas na calçada
Rios de larvas
Inundam o seu coração
Desesperado
(“A Galinha sangra”, Sangue
de Cristo)
Meteoros. Nuvem passageira. Em
São Paulo, o Sangue de Cristo virou a banda glam Jesuítas, tocando entre 1999 e
2004 em noites roqueiras de projetos como o “Música de Fundo”, do músico e
produtor Moisés Santana, no café Piu Piu, templo roqueiro no bairro do Bixiga; na
domingueira do DJ Pomba no (night) club A Lôka na rua Frei Caneca, e nas produções
undergrounds do extinto bar Orbital na rua Augusta, percorrendo um trajeto na
pauliceia desde a região central até os Jardins na zona Sul. Faixas gravadas
nesse período estão disponíveis no MySpace https://myspace.com/sebage2008. O guitarrista Silvio Marne colaborou com esse
entourage do vocalista e compositor Sebage desde as primeiras apresentações dele
aqui, em 1987, no bar Axé e Arte na rua da Praia e no teatro de arena anexo ao
Deodoro, ambos na região central de Maceió.
Mas por onde anda Sílvio
Marne, por onde anda o Romildo Nunes do Odisseia, parceiro irmão do Fernando? “Romildo
está em São Paulo. Ele tem um CD maravilhoso de baladas e pop”, divulga o
produtor amigo Teco Teles. Os vídeos estão no YouTube, as canções são boas,
românticas. Romildo, ou melhor, Dinho Nunes virou um Lloyd Cole do pop
alagoano, com violões, teclados e influência da música baiana – ele morou em
Salvador por uns tempos. Marne foi para o Rio, foi para São Paulo, voltou para
Maceió, retornou ao Rio... Continua sendo o guitarrista feroz que sempre foi. Aliou-se
ao guitarrista Herman Torres, ex-Gang 90, outro exilado da província que também
voltou e atualmente grava jingles, digamos, para sobreviver – sabe como é,
ninguém vive de música autoral e menos ainda de rock em Maceió.
Torres – mais conhecido por
estas plagas como Many – fez história no Rio de Janeiro ao lado do visceral
Júlio Barroso (1953-1984). Depois que o vocalista e letrista da Gang 90 caiu
(pulou?) da janela do apartamento em que morava em São Paulo, Herman Torres
pontuou a MPB com baladas incondicionais como “Paixão”, “Caminho do Sol”
(também gravada por Zizi Possi) e regravou em território caeté o sucesso de
1983, dele e de Barroso, “Nosso Louco Amor”.
Nosso louco amor
está em seu olhar
quando o adeus
vem nos acompanhar
Sem perdão não há
como aprender e errar
Meu amor,
vem me abandonar
Já foi assim
mares do sul
entre jatos de luz,
beleza sem dor
a vida sexual
dos selvagens
Agora aqui
passou a dor
na rua a luz
da cidade ilumina
nosso louco amor
É bom saber
voltou a ser
na rua uma
estrela ilumina
nosso louco amor
Nosso louco amor é mais que um lance de
dados,
não abolirá nosso caso
(“Nosso Louco Amor”, Gang
90)
Flashbacks
No Facebook, lançamos a
pergunta: “Quem tocava com o Djavan no LSD?” Zé Barros responde: “A formação do LSD era... Zé Lino, Tante,
Sula, Beto Batera, Fleury e Djavan. Depois passaram vários músicos”. Beto
Batera o ídolo nativo morto em 2010, aos 60 anos, vítima de cirrose hepática.
Lançada a questão na
rede social, sobre a banda LSD e sobre o Romildo Nunes, imediatamente começaram
as postagens falando de outra banda que não sai da lembrança, o Asas da
Imaginação. A história do rock... Caeté? Pois é, havia uma banda, uma das
tantas que contou com o virtuosismo de Zé Barros, que se chamava Os Caetés.
“Nos anos 1960, toquei com Os Musikents, Os
Tremendões, Os Milionários, Os Magros, e nos anos 70 com Os Wikings, Os
Diamantes, United Youngs, Raízes, Os Caetés, Os Jovens, o LSD quando a banda já
usava o nome Dimensão 7... Nos anos 80 toquei com a Big Banda Show e toquei no Asas
da Imaginação, na Apocalypse Band, ah, nem lembro mais [risos]. O
Asas teve um período de músicas autorais e a formação era Ricardo, Tony, Fábio,
Géo Dalmeida, Nogueira e Pianola. Depois veio a formação ‘baile’ com Ricardo,
Nogueira, Pianola, Pedrinho, Petrúcio e Zé Barros”, lembra o roqueiro veterano,
que, como excelente instrumentista que é, anda se reinventando com um pé no free
jazz a la Jeff Beck, mas com certo sabor regional, buscando quem sabe as
referências do Agreste, da terrinha Paulo Jacinto. Tem clipes desse
instrumental formidável no YouTube, procure “Zé Barros, teatro de Arena”. Outro
dia ele postou na rede a suave “Dois Braços”, tema inspirado nas águas mansas
da barragem Dois Braços, em Quebrangulo.
Pauliceia amiga
São Paulo tem tudo a ver com
o rock alagoano. Muitas bandas desta seara caeté vão bater na porta da loja e
selo Baratos Afins, no centro da capital paulista. O proprietário e produtor
Luiz Calanca é admirador confesso do Mopho e das canções do vocalista e
guitarrista João Paulo, empenhando-se no lançamento nacional da banda em 2000,
com o primeiro álbum homônimo “Mopho”. E continua apostando nesse surpreendentemente
vivo antropofágico rock caeté: em 2012, lançou mais um álbum de estreia, dessa
vez do grupo Messias Elétrico, nova promessa maceioense que traz de volta o
tecladista Leonardo Luiz – o mesmo que ajudou a criar aquele som original
psicodélico do Mopho em 2000 e que, em 2004, foi co-responsável pelo bem
sucedido segundo álbum, o “Sine Diabolo Nullus Deus”, que ele e João Paulo
gravaram em estúdio caseiro, lançando-o nacionalmente, mais uma vez, pela
Baratos Afins.
Tempos passados, nem todos
permanecem na cena e quantos não se cansam ou simplesmente trocam as searas
seja porque descobriram outras vocações ou porque objetivamente
(financeiramente) não dava mais para segurar? O que importa não é o dinheiro,
não é o amor? Importa quem ficou e quem chegou para ficar. Zé Barros se põe em
dia com a própria trajetória e com todas essas novas e clássicas sonoridades
possíveis e impossíveis, tocando rocks instrumentais e participando de diversos
reagrupamentos com todo esse pessoal dos anos 1970. Confira nas agendas
culturais dos sites, na página dele no Facebook e fique ligado, a qualquer
momento um show desse monstro da guitarra, na capital ou em Paulo Jacinto e, se
os deuses conjuminarem, com Sebage em São Paulo, brevemente.
O Mopho está no MySpace no
link http://www.myspace.com/mophobrasil – entre as faixas disponibilizadas, clássicos
como “Não mande Flores” e “Você me disse Adeus”, e mais os dois singles do
álbum de 2011 “Vol. 3” (Pisces Records), “Caleidoscópio” e “Pessoas são de
Vidro”, dão conta da qualidade e longevidade da banda. Na verdade os três
álbuns podem ser ouvidos inteiros no YouTube e, se você procurar direitinho,
também os encontrará disponíveis para o download.
O quarto álbum está no
gatilho. João Paulo diz que não pensa em tocar ao vivo, por enquanto, nem
formar outra banda. Quer ficar em casa de novo com Leonardo Luiz. “Tocamos
muito no ano passado, divulgando o ‘Vol. 3’. Vamos gravar do mesmo jeito que
fizemos com o segundo álbum, eu e o Léo, alternando vários instrumentos. O
resultado no ‘Sine Diabolo’ foi muito bom. O novo disco terá 11 faixas, três em
parceria com Fagner Maranhão. Ele é um fã do Mopho há muito tempo, e a gente
foi se conhecendo – acabamos compondo juntos essas três músicas.”
O problema, segundo João
Paulo, de gravar em casa, é que não há a pressão econômica do estúdio. “Como
você não está pagando horas de gravação, vai esticando mais as coisas. Mas é muito
bom, você acorda, tem uma ideia e vai lá gravar.” O guitarrista promete em
breve disponibilizar um single na internet.
Não mande flores
Eu já cansei
Tenho andado assim
Longe, perto, aqui, ali
Na sua cabeça de foca, milhares de cores
Um pouco de sexo, drogas e rock'n’roll
Eles disseram, você não notou
Que eu sei fingir também
Não quis, não fiz, eu não, não eu
Na sua cabeça de foca, milhares de cores
Eles disseram, você não notou
Que eu sei fingir também
Não quis, não fiz, eu não, não eu
Na sua cabeça de foca, milhares de cores
Um pouco de sexo, drogas e rock'n’roll
(“Não
mande Flores”, Mopho)
Caminhando
para duas décadas à frente do Mopho, João Paulo diz que está feliz com a banda.
“Somos reconhecidos em todo o país, de Norte a Sul, de Leste a Oeste. Temos
essa coisa do feedback, recebemos correspondência do Amapá e do Rio Grande Sul,
isso para falar em termos de extremos.”
Claro, continua sendo
impossível viver do Mopho aqui em Maceió – reconhece o líder da banda. “Mas
isso não tem importância, gravo músicas por outras razões”, sinaliza esse herói
do rock das Alagoas.
E assim caminha o rock
Há uma maturidade roqueira
por estas plagas que vem da trajetória de todas essas bandas, desde lá Os Musikents
de Zé Barros nos anos 1960 e desde o Porções Mágicas no começo dos anos 1980.
Desde o Living in the Shit no iniciozinho dos 90 e desde que o veterano
apaixonado Cícero Flor – semeando um rock rural vibrante e sincero – lançou o
primeiro álbum, “Trilha”, tardiamente em 2005, depois de anos e anos tomando porrada
nesta terrinha nem sempre acolhedora.
Em 2014, há o Autopse, surpreendente
banda de death metal, a garota tocando bateria, outra garota soltando um impressionante
berro gutural em rocks impossíveis cantados em inglês e português. Confere no
YouTube, no SoundCloud, no Facebook – experimente o CD “Descontrole Mental” e
mude um pouco esse pensamento passivo e florido e... Solar. Nem tudo no paraíso
das águas é Lopana e brisa à beira mar.
Um dia Cabral foi dar o seu rolé. Ele tava muito puto,
muito puto com a mulher. Pegou uma caravela encheu de macho e partiu. E
descobriu uma nova terra que é chamada de Brasil.
Pero Vaz de pau duro com uma índia lá na praia. Deu um
toque pro Mané, venha simbora pra gandaia. E não se esqueça, por favor, da
vitrola e rapadura. E traga a cerveja que as mulheres tão todas nuas. (...)
Foi-se o tempo, o juízo e o ouro ninguém viu. Isso é cagado
e cuspido, é história do Brasil.
Um dia uma bicha feia, era princesa Isabel, libertou os
negros. Olha aqui esse papel. E um ano se passou o Brasil virou República, era
15 de novembro, quatro e 20 da madruga. (...)
Belo dia o Juscelino foi beber num armazém, encontrou Lúcio
Costa e Oscar Matusalém. Pelas três da manhã, cheio de mel no seu juízo, foi
cumprir uma promessa feita há tempo num comício.
Levantar uma cidade lá no cafundó do judas. Pra abrigar os
picaretas e os comboios de prostitutas.
Foi-se o tempo, o juízo e o ouro ninguém viu. Isso é cagado
e cuspido, é história do Brasil.
Em 64 com os milicos no poder. Tome porrada em todo mundo.
Aqui nóis bota pra fudê. Com apoio americano o governo sucumbiu. E mandaram
João Goulart para a puta que pariu.
20 anos de porrada. 20 anos de opressão. Torturaram os do
contra no Natal e no São João. Até que Figueiredo se abusou de uma vez. E
entregaram a mangaba pro bigode do Sarney.
Depois veio um playboy. Em seguida Itamar. FHC por oito
anos com o PT a reclamar. E aguardente em pedra dura tanto bate até que Lula se
elegeu presidente e indicou a substituta.
E agora meu cumpadre! A gente bota quem quiser. É só não
vender o voto. E não ser um zé mané. E o Brasil tá crescendo, mas não tem
educação. Deixe a novela de lado e ponha um livro em tua mão.
Foi-se o tempo, o juízo e o ouro ninguém viu. Isso é cagado
e cuspido, é história do Brasil.
(“História do Brasil”,
Herocoice)
Ou nem tudo é corrupção e
malandragem partidária depois do lançamento em abril da banda Herocoice,
encabeçada pelo vocalista Philipe Carvalho, egresso da banda de covers (de
clássicos do Raul Seixas) Cachorro Urubu, e pelo guitarrista John Mendonça,
responsável por uma levada de rocks de protesto que passam a limpo a canalha
política brasileira e alagoana em petardos como “História do Brasil”, “Vermes
da Lombriga” e “O Professor Deputado”, todos em parceria com Thiago Barros, sobrinho
de... Zé Barros – sim, ele mesmo. Videoclipes escrachados e bem produzidos,
roteirizados por Mendonça, invadiram o YouTube com personagens como a “Dona
Vilma”, sisuda de tailleur vermelho distribuindo “pró-labores” para líderes do
“Partido dos Maloqueiros do Brasil”, num inferninho no centro de Maceió – os
“malandros” devidamente acompanhados de marafonas que logo se esbaldam no
rock’n’roll tirando fora sainhas, blusinhas e sutiãs. Folgados e satíricos, os
rapazes do Herocoice lembram os melhores momentos do Camisa de Vênus de Marcelo
Nova.
E Arapiraca que já nos
trouxe o Mopho agora vomita o Kranko, hardcore tosco louco tocado nos porões e
garagens do interior – na histórica Penedo que tem até casa noturna para jovens
(e decanos) metaleiros, o Metal Head Club. Não é ótimo? Ou é muita informação?
Sim, talvez, e você acaba deixando escapar referências importantes e então,
depois, corre o risco de o leitor ligar e dizer: “Poxa, mas você não falou nada
do rock regional progressivo do Xique Baratinho”.
Nem do acachapante Vitor
Pirralho com retaguarda poderosa do grupo Unidade nem do iluminado Luiz de
Assis amparado por uma eloquente usina sonora chamada Vibrações. Bem, estes são
do rap, do reggae... Vão ficar para outro artigo, assim como o nervoso beat eletrônico
do Sonic Junior.
A garotada
A nova geração roqueira nascida
em Maceió e alhures tem um nome: Necronomicon, ou somente Necro, pois que,
recentemente, decidiram simplificar as coisas. Mais uma vez, o
som remete aos anos 1970 – a bandas como Led Zeppelin, Jefferson Airplane,
Black Sabbath –, a sonoridades pesadas, psicodélicas e progressivas. E à
literatura de horror e science fiction do escritor norte-americano H.P.
Lovecraft (1890-1937), de onde surge este livro dos mortos chamado “Necronomicon”
– espécie de Santo Graal às avessas. Mas é também o nome de outras bandas por
esse estranho mundo de Jack.
O enfant terrible Pedro Ivo,
baixista, compositor e vocalista, justifica a mudança. “Necronomicon fechava
muito num nicho, não somos tão ligados assim no horror, na literatura de
Lovecraft... Estamos ligados em questões de ciclos de renovação. O prefixo
necro que vem do grego e significa morte tem mais a ver, abre mais
possibilidades.”
Ivo – integrante também do
Messias Elétrico – é seguramente peça-chave dessa sonoridade clássica ao mesmo
tempo modernizadora do rock made in Alagoas. “Ele é genial. E é muito
simpático, educado e inteligente com aquela pinta de artista de verdade”,
elogia o tecladista-coringa Dinho Zampier, ex-Mopho, atual Wado, Unidade, Cris
Braun...
In the end of day she's
gonna kill you slowly
In the end of night she's gonna kill you again
Everyday she's gonna kill you
No escape, she's gonna kill you
In the dawn of time she
was the whole universe
She's the Queen of Death and I've seen her face
naked
Sadness is what she spreads
No way, you know you can't escape
Queen of Death I saw you
face, I know your name
So I beg you, if you please, dont't kill me
again
No, I can't stand anymore
I never suffered like this before
Let me touch your hands
Don't send me away
I don't understand
I don't wanna die
My Queen of death I love
you
I'm trapped in a nightmare
Convicted by the memories
Save me
(“The Queen of Death”, Necro)
Pedro Ivo diz que o pessoal
do rock têm afinidades “pessoais”, mas “não tanto estilísticas”. “Todo mundo se
conhece e se relaciona, mas as bandas têm sonoridades diferentes.”
“Ele é muito eclético”, diz
Zampier referindo-se ao baixista, que diz que no Messias Elétrico essa questão
sonora “é mais fragmentada”. “São músicos com trajetórias diferentes, não podia
ser de outra forma. A Necro é mais coesa, pensamos mais igual”, arremata o Pedro.
Que este artigo então possa
servir aos leitores fãs das bandas mencionadas aqui como item de colecionador –
um pouco de história, crítica e opinião é bom para situar. Que sirva, também,
aos leitores que mal percebiam o assunto abordado e agora oxalá abram essas
mentes e se entreguem ao deleite sugerido... O rock é sempre um bom motivo para
se compartilhar – que estes 18 mil caracteres (um pouco mais) delimitados pelo
editor tenham-se tornado afinal proveitosos. Até a próxima.