A PANDEMIA DO CORONAVÍRUS E O POVO JERIPANKÓ
Erika Jeripankó
Estudante de Geografia, UFAL, Campus Sertão
Os povos indígenas estão vivenciando
uma série de repetições históricas, dentre elas, destaca-se as epidemias que
chegaram a exterminar aldeias inteiras. Atualmente, a população indígena está
enfrentando o covid-19, que é uma doença respiratória viral provocada pelo
novo coronavírus. Até então, uma epidemia nunca tinha se
alastrado tão rápido entre os povos indígenas quanto o coronavírus. Segundo o
Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena da APIB (Articulação dos povos
Indígenas do Brasil), a letalidade dessa doença em relação aos povos indígenas
é 8,8%, bem maior que a letalidade do restante dos brasileiros, que é
5,2%.
Esta doença está adentrando e se
espalhando rapidamente nos territórios indígenas, pois, segundo a Secretaria
Especial de Atenção à Saúde Indígena (Sesai) entre os povos indígenas, até o
dia 15 de abril apresentava 23 casos suspeitos, 23 confirmados e 3 óbitos. De
forma alarmante, no dia 10º de junho os dados oficiais apresentavam 2.392 casos
confirmados de contaminação, sendo 85 óbitos. No entanto, esses casos estão
sendo subnotificados, pois de acordo com o Comitê Nacional pela Vida e Memória
Indígena da APIB, até o dia 09 de junho, foi informado que tem 94 povos
infectados pelo COVID-19 em todo Brasil, mais de 2.886 indivíduos indígenas com
casos confirmados e 256 óbitos.
De acordo com a APIB, famílias
inteiras estão sendo contaminadas em regiões sem UTI e os que estão chegando
aos hospitais não estão sendo registrados como indígenas, pois estão desconsiderando
os indígenas que residem no meio urbano. Isso explica o fato das notificações
da Sesai serem menores, pois há indígenas que morreram de Covid-19 e não
constam na lista da Sesai. Essa é uma situação crítica de racismo institucional,
um crime que está inviabilizando e desassistindo os povos indígenas, tornando-os
mais vulneráveis.
Mesmo nesse contexto de pandemia, o
atual governo não tem nenhuma ação efetiva para conter a disseminação do vírus entre
os povos indígenas, pelo contrário, este vem atacando diretamente os direitos constitucionais
dos povos originários. Isto está evidente desde o início do governo Bolsonaro,
quando ocorreu as tentativas de acabar com aFUNAI ao retirar tal órgão do Ministério
da Justiça, tentando passar as atribuições de demarcação de terras indígenas
para o Ministério da Agricultura, que é dominado pelo agronegócio. Além do fato
de demandar a municipalização da saúde e educação indígena, sobretudo, o
governo está dificultando as demarcações ao mesmo tempo em que cria propostas
de facilitar a mineração em terras indígenas. Essas ações do governo têm
incentivado as invasões em terras da União, sendo que esses invasores estão
levando um risco extra de contaminação para as aldeias. É uma situação
assustadora, pois além de lutar contra esse inimigo invisível (coronavírus), os
povos indígenas têm que enfrentar massivos ataques do governo, ficando à mercê
desse governo totalmente anti-indígena.
O
coronavírus na aldeia Jeripankó
O povo indígena Jeripankó,
localiza-se em Pariconha, no Sertão de Alagoas, possui uma extensão de 1.215
hectares, dos quais 215 ha estão em posse da comunidade, enquanto a outra
parcela encontra-se em processo de demarcação, na qual estão distribuídas 340
famílias, distribuídas em seis núcleos: Araticum, Caraibeiras, Figueiredo,
Ouricuri, Poço da Areia, Serra do Engenho,
os quais possuem a mesma estrutura organizacional, tendo o mesmo
cacique, pajé e conselhos (tribal, educação e saúde).
Diante da pandemia do coronavírus, as
lideranças (cacique, pajé e o presidente do Conselho de saúde indígena) buscaram
parcerias para ajudar no enfrentamento contra a covid-19, inicialmente
encontraram algumas dificuldades do governo ( tendo em vista que o atual
governo não está apresentando ações positivas para conter a pandemia); porém,
após muitas cobranças feitas aos órgãos que protegem e asseguram legalmente os
direitos indígenas, tais como a Funai, Sesai, Dsei, MPF e também a Prefeitura
Municipal de Pariconha, surtiu-se um efeito, pois o governo através da Sesai no
âmbito do DSEI vem fornecendo uma base para auxiliar na luta, tais como as condições possíveis para que a equipe de
saúde realize seu trabalho dentro do território; além da Funai, que vem
trabalhando junto ao MPF protegendo e fiscalizando as entradas do território,
além disso tem-se ajuda ONGs como o CIMI e APOINME, CONAB.
Porém, falta transportes apropriados para os casos mais
graves por infecção da Covid-19. Ainda ocorre um deslocamento obrigatório de
indígenas até́ a cidade devido a necessidade de acesso a direitos como o
auxílio emergencial, salários, aposentadoria e outros benefícios, o que é
um fato preocupante para o MPF pois pode acelerar a propagação do vírus. O MPF pede a
Funai e a Sesai que sejam elaboradas algumas estratégias para que os povos
indígenas possam acessar esses direitos sem precisar se deslocar até as
cidades. Os órgãos também devem fornecer alimentação e materiais de higiene às
aldeias, pelo mesmo motivo. Em relação a essas medidas, até então foi efetuada
a distribuição de cestas básicas, a proibição da entrada de não índios na
aldeia e, com a ajuda da prefeitura de Pariconha, foi erguida barreira
sanitária na entrada do território; ademais, foram fechadas a maioria das entradas,
deixando uma entrada única para casos de emergência, isso facilita a gestão do
fluxo de pessoas. Todas essas medidas foram tomadas com urgência a partir do
momento em que, infelizmente, surgiram dois casos confirmados para a Covid-19
no povo Jeripankó.
De acordo com Wyraktã, presidente do Conselho de Saúde, uma
das dificuldades enfrentadas foi é a conscientização do povo, pois “a
organização interna é parte essencial, na medida que se o conselho não discute
junto com as lideranças, o cacique e o pajé, a comunidade fica vulnerável”. E segundo
Wyraktã, a maior dificuldade foi tentar mudar a rotina do povo, pois o povo Jeripankó
tem um modo de viver e costumes diferentes do não-indígena, a exemplo: tem as reuniões para fumar cachimbo, as rodas
de conversa, a socialização quando um parente chega de fora, os rituais,
costumes, tradições que são parte essenciais da vida dos Jeripankó. Pois é um
povo que carrega no sangue a vontade de dançar um Toré, de se reunir com o seu
povo na beira de um terreiro e ver os praiás dançar, de entoar seus cânticos para
os encantados. Os Jeripankó necessitam disso para manter as suas forças e
crenças.
É justamente esse modo de vida coletiva dos
indígenas que está dificultando as ações das lideranças. A vida coletiva é uma
coisa boa, mas em relação ao covid-19 se torna um grande obstáculo. Um outro
agravante é a questão territorial, pois cerca de um terço das 340 famílias
estão desaldeadas, encontra-se à margem, seja
morando na cidade ou em outros povoados. Isso significa que o Conselho, a Funai
e a Secretária de Saúde têm que lidar com essas questões dos indígenas que
estão fora do território delimitado, e isso dificulta as ações dos
profissionais de saúde. Há também uma enorme preocupação com a população idosa,
pois existe poucos anciões que resguardam as histórias dos ancestrais, eles são, simplesmente,
tesouros vivos, fonte de manutenção da cultura dos Jeripankó.
No entanto, o povo Jeripankó resiste e segue firme na luta, e assim como os seus antepassados que resistiram as expropriações de seus territórios, que migraram para novas terras e construíram um novo território, lutaram pelos seus direitos perante a constituição; superaram os ditames da ditadura, a perseguição e balas dos coronéis e outras elites dominantes; resistiram ao silenciamento de sua cultura, tão bem como a outras epidemias; segue usando seus costumes tradicionais, seus remédios caseiros para melhorar o sistema imunológico. Os povos indígenas unidos irão vencer mais essa batalha.
A coordenação da coleta de material escrito por índios é realizada pelo Professor Dr. Amaro Hélio Leite da Silva e comporá um suplemento de Campus/O Dia. O blog pode discordar no todo ou em parte das publicações que realiza.
No entanto, o povo Jeripankó resiste e segue firme na luta, e assim como os seus antepassados que resistiram as expropriações de seus territórios, que migraram para novas terras e construíram um novo território, lutaram pelos seus direitos perante a constituição; superaram os ditames da ditadura, a perseguição e balas dos coronéis e outras elites dominantes; resistiram ao silenciamento de sua cultura, tão bem como a outras epidemias; segue usando seus costumes tradicionais, seus remédios caseiros para melhorar o sistema imunológico. Os povos indígenas unidos irão vencer mais essa batalha.
A coordenação da coleta de material escrito por índios é realizada pelo Professor Dr. Amaro Hélio Leite da Silva e comporá um suplemento de Campus/O Dia. O blog pode discordar no todo ou em parte das publicações que realiza.