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terça-feira, 19 de maio de 2020

Aprigio Vilanova. Pelo menos é isso o que espero! Memória da pandemia nas Alagoas


Pelo menos é isso o que espero!

 Aprigio Vilanova 

Jornalista formado pela Universidade Federal de Ouro Preto – MG (Ufop), fundador da revista eletrônica Ocho2 e com trabalhos publicados no El País, National Geographic, entre outros veículos de mídia

As notícias chegaram da China, da Itália, se espalharam pela Europa e revelavam o terror vivido por aquelas populações.

 Estava longe, pensaram nossas autoridades.

Não levamos a sério o perigo que nos avizinhava. O vírus chegou e, com ele, a sensação de um pesadelo vivido em um filme hollywoodiano pós apocalíptico. Máscaras, isolamento, álcool 70%, álcool em gel, distanciamento social, quarentena, lockdown, palavras recorrentes no noticiário e que nos martelam diuturnamente.

Nunca imaginei viver um momento como esse, estamos todos atados e o desejo é que sobrevivamos. Acontece que mais de 17 mil brasileiros já não estão mais aqui e, entre estes, muitos irresponsáveis que subdimensionaram a gravidade da doença; outros foram vitimados pelo comportamento genocida dos primeiros. O mundo agoniza e revela a nossa falência.   

Em poucos eventos é possível ter a sensação de viver a história que entrará nos livros e esses é um daqueles que chegam sem pedir licença; arrombam a porta, invadem nossas vidas e nos revelam a nossa insignificância e a nossa vulnerabilidade.

É o tipo de acontecimento que serve de referência para explicarmos uma época - os velhos do amanhã, tomara que estejamos entre estes - falarão deste momento para seus filhos e netos.
- Em 2020, o mundo foi atingido por uma pandemia que vitimou centena de milhares de pessoas nos quatro cantos da terra redonda...

Se Eric Hobsbawn, o grande historiador inglês, estivesse vivo, não tenho dúvidas que utilizaria a pandemia da Covid-19 como marco referencial para o novo mundo que está para nascer; a entrada no século 21 e a chegada do segundo milênio.

Bem-vindo então novo século, mas você não foi convidado, pelo menos não assim. Que sirva para evoluirmos enquanto humanos, neste momento o otimismo disputa espaço com o realismo, uma parte roga que saiamos melhores, a outra grita prudência, exige pessimismo.

Por um lado, as previsões são as mais desalentadoras: aumento do controle social, vigilância digital, novas relações de trabalho, na qual a rede de garantias e proteção tende a desaparecer.

O biopoder, conceito problematizado por Foucault, impera como nunca nas sociedades modernas: regulação, subjugação, controle dos corpos e das populações. Este importante conceito filosófico nos mostra um caminho para o amanhã. Como disse o poeta: “amanhã vai ser outro dia”, só não sabemos o que nos reserva o futuro.

O vírus viralizou como nunca houve registro e escancarou a nossa falência, o ser humano falhou, a sociedade está em colapso. Os sistemas de saúde não suportam a alta proliferação do vírus, estamos em meio ao caos e o pior ainda nem chegou, pelo menos para nós brasileiros.

Os prognósticos são desesperadores e para piorar temos um presidente que tripudia, prefere jogar para a plateia fanática numa falsa simetria de problemas. Empatia é ‘artigo’ em falta no lado esquerdo da praça dos Três Poderes.

Como jornalista, o momento é difícil, é desafiador. Parafraseando o poeta: “todo artista tem de ir aonde o povo está” -  assim também é com o jornalista. Está nas ruas, conversar com pessoas, são duas exigências fundamentais e é tudo o que não recomenda-se neste momento, o vírus chegou e colocou a vida de cabeça para baixo, afetou as relações, a convivência, nos distanciou de quem gostamos.

O vírus nos arranca a normalidade, mas também nos oferece um momento para refletirmos. Há que fale em um novo normal pós pandemia.

Refletirmos sobre o que estamos fazendo do mundo, no mundo, pro mundo é exigência mais que urgente. A quarentena tem que servir de momento de reflexão para gestar o mundo que queremos.
A pandemia colocou em xeque nossa organização social, urge um novo modelo, urge colocarmos a empatia como condição sine qua non para o mundo novo que desejamos, este que vivemos faliu, acabou.

Se pensarmos a população brasileira veremos que o vírus da Covid-19 é tão perigoso quanto o ‘vírus’ do ódio disseminado pelo presidente da República. Jornalistas hostilizados, profissionais da saúde sendo agredidos, uma turba saindo as ruas, estimulados pelo presidente, contrariando todas as recomendações dos organismos de saúde e urbanidade.

Amontoam-se feito manada pedindo o fim da democracia. É a ignorância em seu estado puro, é quase um convite ao suicídio atendido prontamente sem a menor reflexão. Apenas vão em direção a morte e não percebem.

Como se não bastasse o problema de saúde pública, grupos extremistas promovem uma disseminação em massa de falsas notícias, gerando pânico, desespero e estimulando comportamentos extremados.
Esses grupos propagadores de mentiras também precisam serem identificados e punidos. O mundo conectado em redes sociais digitais e a má fé na utilização destes instrumentos, são também um problema de saúde. Muitos estão morrendo vítimas da proliferação de fake News. Mais um desafio para o momento.

Que mundo surgirá após a pandemia não é possível saber, a futurologia não encontra respaldo na ciência, mas é possível afirmar que muitos de nós sairemos melhores, mais solidários, mais empáticos, mais generosos, mais humanos. É impossível passar incólume por esse turbilhão, sairemos melhores e mais fortes desse pesadelo, isso já é o primeiro passo para um novo mundo que começa a ser gerado.   

Pelo menos é isso o que espero.


Projeto Memória da Pandemia nas Alagoas
Coordenação
Luiz Sávio de Almeida e José Carlos Silva de Lima
O blog pode concordar ou não, em parte e no todo, com a matéria publicada
Nosso objetivo é deixar um painel diversificado sobre a pandemia nas Alagoas

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