Pelo menos é isso o que espero!
Aprigio Vilanova
Jornalista formado pela Universidade
Federal de Ouro Preto – MG (Ufop), fundador da revista eletrônica Ocho2 e com
trabalhos publicados no El País, National Geographic, entre outros veículos de
mídia
As notícias chegaram da China, da Itália, se espalharam pela
Europa e revelavam o terror vivido por aquelas populações.
Estava longe, pensaram
nossas autoridades.
Não levamos a sério o perigo que nos avizinhava. O vírus
chegou e, com ele, a sensação de um pesadelo vivido em um filme hollywoodiano pós
apocalíptico. Máscaras, isolamento, álcool 70%, álcool em gel, distanciamento
social, quarentena, lockdown, palavras recorrentes no noticiário e que nos
martelam diuturnamente.
Nunca imaginei viver um momento como esse, estamos todos
atados e o desejo é que sobrevivamos. Acontece que mais de 17 mil brasileiros
já não estão mais aqui e, entre estes, muitos irresponsáveis que subdimensionaram
a gravidade da doença; outros foram vitimados pelo comportamento genocida dos
primeiros. O mundo agoniza e revela a nossa falência.
Em poucos eventos é possível ter a sensação de viver a
história que entrará nos livros e esses é um daqueles que chegam sem pedir
licença; arrombam a porta, invadem nossas vidas e nos revelam a nossa
insignificância e a nossa vulnerabilidade.
É o tipo de acontecimento que serve de referência para
explicarmos uma época - os velhos do amanhã, tomara que estejamos entre estes -
falarão deste momento para seus filhos e netos.
- Em 2020, o mundo foi atingido por uma pandemia que vitimou
centena de milhares de pessoas nos quatro cantos da terra redonda...
Se Eric Hobsbawn, o grande historiador inglês, estivesse
vivo, não tenho dúvidas que utilizaria a pandemia da Covid-19 como marco
referencial para o novo mundo que está para nascer; a entrada no século 21 e a
chegada do segundo milênio.
Bem-vindo então novo século, mas você não foi convidado, pelo
menos não assim. Que sirva para evoluirmos enquanto humanos, neste momento o
otimismo disputa espaço com o realismo, uma parte roga que saiamos melhores, a
outra grita prudência, exige pessimismo.
Por um lado, as previsões são as mais desalentadoras: aumento
do controle social, vigilância digital, novas relações de trabalho, na qual a
rede de garantias e proteção tende a desaparecer.
O biopoder, conceito problematizado por Foucault, impera como
nunca nas sociedades modernas: regulação, subjugação, controle dos corpos e das
populações. Este importante conceito filosófico nos mostra um caminho para o
amanhã. Como disse o poeta: “amanhã vai ser outro dia”, só não sabemos o que
nos reserva o futuro.
O vírus viralizou como nunca houve registro e escancarou a
nossa falência, o ser humano falhou, a sociedade está em colapso. Os sistemas
de saúde não suportam a alta proliferação do vírus, estamos em meio ao caos e o
pior ainda nem chegou, pelo menos para nós brasileiros.
Os prognósticos são desesperadores e para piorar temos um
presidente que tripudia, prefere jogar para a plateia fanática numa falsa
simetria de problemas. Empatia é ‘artigo’ em falta no lado esquerdo da praça
dos Três Poderes.
Como jornalista, o momento é difícil, é desafiador. Parafraseando
o poeta: “todo artista tem de ir aonde o povo está” - assim também é com o jornalista. Está nas ruas,
conversar com pessoas, são duas exigências fundamentais e é tudo o que não
recomenda-se neste momento, o vírus chegou e colocou a vida de cabeça para
baixo, afetou as relações, a convivência, nos distanciou de quem gostamos.
O vírus nos arranca a normalidade, mas também nos oferece um
momento para refletirmos. Há que fale em um novo normal pós pandemia.
Refletirmos sobre o que estamos fazendo do mundo, no mundo,
pro mundo é exigência mais que urgente. A quarentena tem que servir de momento
de reflexão para gestar o mundo que queremos.
A pandemia colocou em xeque nossa organização social, urge um
novo modelo, urge colocarmos a empatia como condição sine qua non para o mundo novo que desejamos, este que vivemos
faliu, acabou.
Se pensarmos a população brasileira veremos que o vírus da
Covid-19 é tão perigoso quanto o ‘vírus’ do ódio disseminado pelo presidente da
República. Jornalistas hostilizados, profissionais da saúde sendo agredidos,
uma turba saindo as ruas, estimulados pelo presidente, contrariando todas as
recomendações dos organismos de saúde e urbanidade.
Amontoam-se feito manada pedindo o fim da democracia. É a
ignorância em seu estado puro, é quase um convite ao suicídio atendido
prontamente sem a menor reflexão. Apenas vão em direção a morte e não percebem.
Como se não bastasse o problema de saúde pública, grupos
extremistas promovem uma disseminação em massa de falsas notícias, gerando
pânico, desespero e estimulando comportamentos extremados.
Esses grupos propagadores de mentiras também precisam serem
identificados e punidos. O mundo conectado em redes sociais digitais e a má fé
na utilização destes instrumentos, são também um problema de saúde. Muitos
estão morrendo vítimas da proliferação de fake News. Mais um desafio para o
momento.
Que mundo surgirá após a pandemia não é possível saber, a
futurologia não encontra respaldo na ciência, mas é possível afirmar que muitos
de nós sairemos melhores, mais solidários, mais empáticos, mais generosos, mais
humanos. É impossível passar incólume por esse turbilhão, sairemos melhores e
mais fortes desse pesadelo, isso já é o primeiro passo para um novo mundo que
começa a ser gerado.
Pelo menos é isso o que espero.
Projeto Memória da
Pandemia nas Alagoas
Coordenação
Luiz Sávio de Almeida
e José Carlos Silva de Lima
O blog pode concordar
ou não, em parte e no todo, com a matéria publicada
Nosso objetivo é
deixar um painel diversificado sobre a pandemia nas Alagoas