quarta-feira, 22 de abril de 2020

Memória da Pandemia nas Alagoas (i): Luiz Sávio de Almeifa. E agora Bolsonaro?



E agora Bolsonaro?

Esta matéria foi publicada no Suplemento Campus do Jornal o Dia (Maceió). Aquarela de Eduardo Bastos.

Luiz Sávio de Almeida

Professor Emérito da Universidade Federal de Alagoas e Dr. em História

Bolsonaro, o Presidente, passa por uma pesada avaliação interna e externa. Pelo menos dois importantes órgão da imprensa internacional foram impiedosos na avaliação que realizar. Um deles foi o ultra diabólico-comunista The Washington Post   e o outro foi um jornal de alta evidência  na Itália: Corriere della Sera.  Ambas as matérias foram comentadas por outra terrível comunista: A Revistas Veja. Quanto mais o bolsonarismo não faz uma reflexão sobre as críticas que recebe, quanto mais fica difícil manter-se na política brasileira sem ser um bolsão à parte, não se integrando de fato à normalidade democrática que o país deve seguir.  E sinceramente, não estou pensando partidariamente, até mesmo por não pertencer a algum; somente pertenci ao Partido Socialista Brasileiro quando  o Presidente era um amigo: o Senador Jamil. 
Ele não é um grupo que está para fora, habilitado a fazer alianças; ele é um grupo para dentro e parece interessar-se apenas por um núcleo e devora-se para manter o bolsão, sabendo Bolsanaro com quem pode ou não mexer. No entanto, por mais para dentro que seja, a sua natureza de governo está escancarada nesta condução da pandemia. Não me interessa analisar isto em profundidade, pois não cabe aqui, o que eu faria tranquilamente numa mesa de debate em uma discussão acadêmica pois, aí, é meu mundo. Não define minhas posições, o fato de que  Bolsonaro representa posições de direita. Ainda sinceramente, a esquerda não tem monopólio de decência, honestidade e capacidade. A mim, no jogo político, competiria combater as propostas, discutir, preparar-me com as devidas cautelas para uma disputa eleitoral.
Muitas pessoas voltaram em Bolsonaro por não encontrarem alternativa, outras pela diabolização do PT que, por sinal, tem culpas a serem ponderadas e ele sabe disto.  Outras por achar que ele legitimamente representava seus interesses. O que me incomoda politicamente é o bolsão e a diabológica como ele opera, dando-se ao termo, uma aproximação ao que escreveu Poliakov.  Mandetta foi bem mais inteligente do que o bolsão e foi um conservador extraordinariamente subversivo, pois demonstrou o bolsão na sua pior face: a intolerância numa época de hecatombe nacional que chega a passar por cima de  renda e classe, a todos atingindo, embora seja mais do que sabido, a pobreza que se segure agarrada não sei em quê.
Foi nesta oportunidade que Bolsonaro se perdeu na peleja  com Mandetta e a demissão do deputado tem consequências muito graves:  é  quando se nota a força do bolsão. Acontece que, talvez, quanto mais Bolsonaro força o bolsão, mais se encolhe. Suas perdas são mais do que sensíveis, dentre os seus eleitores que não são bolsonistas; basta ler as pesquisas, pensar no que elas vêm apontando. Se Mandetta esteve com algum jogo político, na certa venceu: o bolsão encolheu-se bem mais e inclusive, em termos da opinião pública, algo difícil a definir no Brasil. É que Bolsonaro parece armar uma estratégia que a longo prazo não será eficiente e tudo tem a ver, a todo o momento, com a próxima eleição para a presidência.  Parece-nos que ele nunca está agora e sim no que vem e, por outro lado, tem de destruir para ter força, como seu próprio partido foi destruído. Ele não é um arquiteto do caos, mas, apesar disto, pensa que poderá ordená-lo.
A sustentação do bolsão levou à perda de aliados sérios, como o Governador Caiado, peso de referência no que poderia ser chamado de direita agrária, embora modernizante na produção, típico defensor do agronegócioa, mas que não teve condições de aceitar as tiradas do Bolsonaro sobre a epidemia. Caiado é homem de ligação com Mandetta, como Mandetta é com o Presidente do Senado e o da Câmara Federal.  Não se pode adivinhar qual a posição do Bolsonaro, mas Mandetta que se prepare: o que haverá de acusações por parte do bolsão será algo imenso e, possivelmente, Bolsonaro na sua tática de atuação, ira aparentar seguir as ideias que eram apresentadas, para acusar Mandetta e afastá-lo cada vez mais, logo ele, o conservador que se tornou subversivo. Inclusive, por falta de jogo de cintura; note-se quantas vezes, usou o pronome eu e quantas vezes usou o substantivo governo. Político que perde, vira casca de pereba e ele vai ter que mergulhar, pois é difícil um derrotado ter aliados.  Derrota, é possivelmente, um dos maiores e mais terríveis inimigos de uma carreira perdida. Aliás. Ônix já começou com suas alfinetadas na direção do descrédito de Mandetta e vai ficar cada vez pior, ele que diss da fraqueza de Bolsonaro, aproveita a oportunidade e desce de escafandro, novamente, no bolsão.
Quem será o próximo candidato a Oswaldo Cruz? O que Bolsanaro irá pedir dele? Eis o mistério. Mandetta não tem alternativa, mesmo com 80% da população contra sua saída.  Ficam os 20% do bolsão, um  quinto dos eleitores e Bolsonaro irá tentar aumentar este percentual, se bem que se coloca em dúvida a capacidade de Guedes conduzir a recuperação por dois motivos: a) o fato de Bolsonaro não saber e não querer construir aliados e b) a insuficiência de seu liberalismo, da sua divinização do mercado contra a diabolização do estado; teses aliás, destruídas no que vivemos onde, sem estado, a crise social, econômica e política já teria avançado a patamares inusitados.
No meio disto tudo, Bolsonaro consegui um feito: ser pior do que Trump, o que digamos, é algo difícil de se conseguir. O site Rede Brasil Atual comentou um editorial do The Washington Post cujo título era espantoso: “ Leaders risk lives by minimizing the corona virus. Bolsonaro is the worst”. Ele está sendo internacionalmente acusado de colocar em risco a vida do povo e o editorial é severo em seu julgamento: é o pior de todos. O jornal acompanhava o cotidiano de Bolsonaro,  os riscos em que colocava  população. E aconselha a que se veja o próprio Trump, quando mudou de orientação e esteve partilhando da ideia de isolamento. Na data de hoje, o mesmo jornal fala da disputa do Presidente com Mandetta.  Mas o Corriere dela Sera entra por linha semelhante e foi comentado no site  da Revista Veja. O jornal estudou a posição de  dez lideres internacionais e a pior nota foi Bolsonaro. Claro que se trata de um jornal comunista; se não fosse, não iria reduzir a tal ponto a cotação do Mito.
Realmente não se pode entender que a posição de Bolsonaro não tenha causado impacto em setores da população pois, afinal de contas, não era um mero cidadão e sim, um Presidente da República.  Se é verdade o que as pesquisas revelam sobre a contaminação e aumento de casos e pressão sobre o sistema de saúde, ele tem, de alguma forma, que ser responsabilizado.  O que não posso falar é sobre o tamanho desta responsabilização e o que dirá o Supremo Tribunal Federal, que tomou decisão contra medidas que se choquem com as aconselhadas pela agência especializada da ONU, aquela que Trump está tentando acabar. Se uma voz de peso se levantar no Brasil contra o que Bolsonaro fez o8 ocasionou, a coisa fica feia.


Esta série tem por objetivo publicar depoimentos sobre  como se pensa e se lida com o Corona em Alagoas.  Está aberta a toda e qualquer pessoa, de qualquer tendência. É uma documentação organizada, sobretudo, para um futuro estudioso de como a epidemia foi vista e vivida em Alagoas. O material será publicado  paulatinamente no  suplemento Campus do jornal O Dia. Está sendo  organizado por Carlos Lima, Mestre em História pela Universidade Federal de Alagoas e Luiz Sávio de Almeida. O blog pode discordar de parte ou do todo da matéria publicada.