domingo, 24 de maio de 2020

Cícero Ferreira de Albuquerque. Como será o novo normal? Memória da pandemia nas Alagoas


Como será o novo normal? 

Cícero Ferreira de Albuquerque


Cientista social. Professor da UFAL


A humanidade está vivendo duas grandes novas experiências: a pandemia da Covid-19 e o advento de um grave problema global. Há algo de extraordinário em tudo isso! Como nunca antes, temos um tema, um problema, um desespero e uma necessidade comuns. Precisamos construir saídas comuns.
A pandemia causada pela Covid-19 provoca milhões de adoecimentos, milhares de mortes e exige da humanidade três grandes atitudes. Resignação e resiliência são as primeiras. Chamamos de resignação a capacidade de saber enfrentar os sofrimentos que a vida inflige, dos quais nem sempre podemos escapar; e de resiliência a habilidade de se adaptar às adversidades, de superá-las e de tirar lições das experiências dolorosas. Resignação e resiliência são chaves através das quais indivíduos e coletivos melhor lidam com perdas e dores que não foram evitadas em tempo hábil ou que são inevitáveis.
Ante a ameaça e a efetiva perda de vidas, outra atitude tem sido muito comum nos dias que correm: a esperança, força vital de mobilização individual e coletiva. Quando de boa origem religiosa, ganha expressão nos clamores por força para enfrentar a dor e o sofrimento desse momento e brota nas preces por luz e sabedoria para encontrar saídas.
A ciência é outra fonte de esperança. Centenas de estudos estão em curso, diversos pesquisadores buscam soluções que previnam do vírus e curem a doença. Só no Brasil, conforme dados da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES), em 46 universidades federais, apesar dos cortes de recursos para pesquisas feitos pelo governo Bolsonaro, estão em curso 823 pesquisas que visam mapear o novo coronavírus e encontrar uma vacina para a Covid-19. É muita balbúrdia!
A razão científica não é mágica, nem pode tudo, mas através dela encontraremos saídas para os desafios impostos pela Covid-19. Essa pandemia, em breve, será apenas mais um registro trágico na história da humanidade. Porém, enquanto tempos gratos não chegam, o certo é que nos encontramos diante de muitas questões, entre elas: como será o mundo depois que a turbulência da pandemia passar?
Há quem afirme que o mundo sairá pior do que entrou na pandemia, que será mais injusto e desigual, e que o capitalismo se mostrará ainda mais infame. Mas há também quem defenda que o mundo sairá melhor dessa pandemia, com valores de empatia e solidariedade renovados. Se isso acontecer, a humanidade terá aprendido com a dor e com o sofrimento, buscará novos sentidos para a sua existência, sentidos mais respeitosos com as infinitas outras formas de vida e regidos por princípios de tolerância e de justiça social.
Muitas serão as lições. O maior drama da humanidade hoje não é a Covid-19, mas a dificuldade de prevenir e de atender plenamente os que adoecem. Muitas mortes, talvez a maioria, acontecem por falta de assistência adequada. Sem um rígido distanciamento social, os sistemas públicos e privados de saúde não terão condições de atender a todos os contaminados. Os países que não têm um bom sistema público de saúde estão sendo mais castigados pela Covid-19.
A crise atual revela mais uma vez quão perverso é o capitalismo de cunho neoliberal. O sistema privado de saúde é um mercado mais que cruel. Quem pode evitar ou moderar a mercantilização da saúde é o Estado, mas não tem sido assim. É mentira que a Covid é uma doença democrática. Os pobres são as suas maiores vítimas. No Brasil, como em nenhum outro momento, apesar das sabotagens há muito enfrentadas, reafirma-se a imprescindibilidade do SUS na vida do país. Mais, cresce a exigência social de fortalecimento do SUS. Há uma mudança de patamar na nossa reivindicação de mais SUS e melhor SUS.
Resignação, resiliência e esperança não são valores que, necessariamente, geram amoldamentos e conformismos. Bem orientados, eles nutrem a nossa capacidade de resistir e compreender que certas circunstâncias são inerentes à vida e que não devem paralisá-la. Tudo isso promove vínculos que não cabem nas perversas lógicas de mercado, nem nas ideologias filosóficas e políticas que impulsionam o egoísmo e o ódio social. Assim, aqui estamos, assustados e temerosos, mas convictos de que a superação dessa pandemia ou será uma conquista do mundo todo ou não será de ninguém. Que assim seja o novo normal!

Projeto Memória da Pandemia nas Alagoas
Coordenação
Luiz Sávio de Almeida e José Carlos Silva de Lima
O blog pode concordar ou não, em parte e no todo, com a matéria publicada
Nosso objetivo é deixar um painel diversificado sobre a pandemia nas Alagoas